O que é o Tarifaço dos EUA e por que ele não muda a vida do brasileiro comum

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Nos últimos dias, o termo “tarifaço” voltou ao noticiário internacional, com a nova política tarifária anunciada pelo governo dos Estados Unidos. O presidente norte-americano Donald Trump determinou, por meio de decretos e ordens executivas, o aumento de tarifas de importação sobre diversos países, incluindo o Brasil. A medida, chamada informalmente de “Tarifaço da Libertação” (Liberation Day Tariffs), é parte de um esforço do governo americano para proteger a indústria nacional e reduzir o déficit comercial.
Mas, afinal, o que é esse tarifaço? Como ele afeta o Brasil? E quem realmente deve se preocupar?

O que é o tarifaço?
O tarifaço é um conjunto de medidas unilaterais do governo dos EUA que impõem tarifas adicionais sobre a entrada de produtos estrangeiros no território americano. No caso do Brasil, a tarifa anunciada em julho de 2025 prevê uma alíquota de 50% sobre todos os produtos brasileiros importados pelos EUA, com início a partir de 1º de agosto.
Na prática, isso significa que um produto brasileiro vendido para os Estados Unidos será taxado com um adicional de 50% sobre o valor da mercadoria ao entrar no mercado americano. A medida foi amplamente criticada por diversos setores da economia brasileira, mas também provocou reação de países europeus, asiáticos e latino-americanos.

Impactos para o Brasil
Os principais afetados são os exportadores brasileiros, especialmente dos setores:
• Agroindustrial (café, suco de laranja, carnes)
• Aeroespacial (como aviões da Embraer)
• Químico e farmacêutico
• Produtos semiacabados e industriais
Com as tarifas, os produtos brasileiros perdem competitividade no mercado americano, podendo levar à redução de contratos, perda de mercado e até cancelamento de exportações. Empresas já relataram paralisações temporárias de pedidos.
Entretanto, a vida do brasileiro médio não muda com o tarifaço. Isso porque a medida não afeta o consumo interno, não aumenta impostos no Brasil, nem altera diretamente os preços no mercado nacional. Também não encarece produtos importados dos EUA para o Brasil, já que não se trata de uma tarifa brasileira.

E os americanos que querem investir no Brasil?
Investidores americanos — sejam empresas ou pessoas físicas — não são afetados por essas tarifas ao operar dentro do território brasileiro. Ou seja, se um norte-americano quiser abrir uma empresa no Brasil, participar de joint ventures, comprar imóveis ou investir em fundos locais, não há impacto tarifário proveniente do tarifaço.
Da mesma forma, empresas americanas estabelecidas no Brasil que produzem localmente ou prestam serviços seguem operando normalmente. O tarifaço não tem efeitos sobre transações realizadas dentro do Brasil.

E os brasileiros que investem nos EUA?
Aqui, os cuidados são outros. O Brasil não retaliou formalmente com tarifas, mas analisa contramedidas com base na Lei de Reciprocidade Comercial (Lei nº 15.122/2025). No momento, não há tarifas adicionais para brasileiros investindo nos Estados Unidos, mas isso pode mudar, especialmente se o contencioso comercial se agravar na OMC (Organização Mundial do Comércio).
Além disso, vale lembrar que brasileiros que enviam dinheiro ao exterior para investimentos já enfrentam aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), medida independente do tarifaço americano.

Aumento do IOF em remessas ao exterior: o que mudou?
Em abril de 2025, o Governo Federal publicou o Decreto nº 12.466/2025, elevando significativamente a alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) aplicável às remessas de recursos ao exterior realizadas por pessoas físicas e jurídicas.
Antes da mudança, a alíquota do IOF para envio de recursos ao exterior para a maioria das finalidades era de 0,38%, especialmente em transferências pessoais, aplicações financeiras e investimentos. Com o novo decreto, a alíquota foi majorada, porém as remessas via fundos brasileiros registrados na CVM com alocação externa permanece isenta.

Por que o IOF impacta operações como offshore, conta internacional ou investimentos no exterior?

A elevação causou forte repercussão no mercado financeiro e entre brasileiros com operações internacionais.
Após críticas, o Decreto nº 12.467/2025, publicado em 23 de maio, reduziu parte das alíquotas, mas manteve a cobrança majorada sobre pessoas físicas que enviam recursos diretamente ao exterior (a 1,1% para algumas finalidades e 3,5% para outras, especialmente quando não caracterizado investimento regulado).

1. Aumento de custo direto e imediato
Quando o brasileiro decide enviar valores para o exterior para:
• abrir ou alimentar uma conta bancária pessoal;
• investir em corretoras estrangeiras (EUA, Europa, Ásia etc.);
• manter uma estrutura offshore (empresa, trust, holding patrimonial);
ele precisa realizar uma operação de câmbio, mesmo que online. Esta operação é intermediada por banco ou corretora autorizada e obrigatoriamente tributada pelo IOF.
Com a nova alíquota de até 3,5%, esse custo passou a ser relevante:
• Antes, remeter R$ 100.000 ao exterior custava R$ 380 de IOF;
• Agora, a mesma operação pode custar R$ 3.500 de IOF (aumento de mais de 800%).
Isso reduz a atratividade das operações internacionais, afeta a liberdade de planejamento patrimonial internacional e penaliza o investidor comum que busca diversificação de carteira.

2. Desincentivo à dolarização e proteção cambial
Brasileiros que utilizam contas no exterior para se proteger da volatilidade do real ou da instabilidade política/econômica agora precisam pagar mais imposto para dolarizar seu patrimônio. Isso desestimula práticas legítimas de proteção cambial e diversificação de riscos.

3. Offshores e estruturas internacionais penalizadas
Indivíduos que mantêm estruturas internacionais de planejamento patrimonial (como holdings offshore, fundos controladores ou trustes) são diretamente impactados:
• A movimentação de recursos entre Brasil e exterior para alimentar essas estruturas agora é mais onerosa.
• Embora o IOF não incida sobre os rendimentos em si, ele incide sobre cada remessa feita para formação ou capitalização da offshore.

Relação com o tarifaço dos EUA: nenhuma
O tarifaço norte-americano é um instrumento de política comercial externa, aplicado sobre produtos importados nos EUA. Já o IOF é um instrumento de política fiscal interna, usado para modular o fluxo de capital cambial e arrecadar recursos para o Tesouro Nacional.
Ou seja:
• O tarifaço penaliza o exportador brasileiro que vende para os EUA.
• O aumento do IOF penaliza o brasileiro que envia dinheiro ao exterior, mesmo que apenas para investir ou guardar.
Portanto, não há qualquer conexão normativa ou causal entre as duas medidas. São políticas distintas, com efeitos distintos, e originadas por governos diferentes, em contextos diversos.

Qual a justificativa oficial do governo brasileiro?
Segundo o Ministério da Fazenda, o aumento do IOF tem como objetivos:
• Desestimular a evasão de capitais não declarados;
• Reequilibrar a balança de capitais, diante da pressão cambial;
• Aumentar a arrecadação imediata, dada a limitação orçamentária de 2025;
• Forçar maior controle fiscal sobre remessas não transparentes.

No entanto, o mercado financeiro, tributaristas e planejadores patrimoniais criticam a medida, apontando que ela:
• penaliza operações regulares e declaradas;
• incentiva remessas via métodos informais ou criptoativos;
• desestimula a internacionalização de portfólios e enfraquece a competitividade dos brasileiros no exterior.

O que não muda com o tarifaço

• Viajar para os EUA: O tarifaço não afeta vistos, passagens ou turismo.
• Investimentos estrangeiros no Brasil: continuam isentos das tarifas americanas.
• Serviços e contratos no Brasil com participação americana: seguem em operação regular.
• Empresas brasileiras com foco no mercado interno: não enfrentam impacto direto.

Conclusão

O tarifaço é, sem dúvida, um fator de tensão nas relações comerciais entre Brasil e Estados Unidos. Porém, seus efeitos são específicos: afetam exportações brasileiras destinadas ao território americano. Para a população em geral, os impactos são indiretos e restritos a setores exportadores.
Da mesma forma, americanos que queiram investir ou operar no Brasil não são prejudicados por essas medidas. O ambiente jurídico e regulatório brasileiro segue receptivo ao investimento estrangeiro direto.

O cenário do tarifaço exige atenção, mas não pânico. Ainda há espaço para negociações diplomáticas e comerciais, e tanto Brasil quanto EUA têm interesse mútuo em manter canais abertos para o comércio e o investimento.

Ao passo que o aumento do IOF nas remessas internacionais é uma medida interna do governo brasileiro que impacta diretamente pessoas físicas e jurídicas que movimentam capital para o exterior — inclusive para fins legítimos e transparentes, como planejamento sucessório, proteção patrimonial e diversificação de investimentos.

Essa medida não tem relação com o tarifaço norte-americano. Enquanto o tarifaço afeta exportadores brasileiros que vendem aos EUA, o novo IOF impacta o brasileiro comum que quer simplesmente guardar ou aplicar seus recursos fora do país.

É essencial, portanto, distinguir os dois fenômenos: o primeiro é uma questão de geopolítica comercial internacional; o segundo, de política tributária interna e imediata do Brasil.