Medida pode dificultar ou até mesmo inviabilizar colaborações entre cientistas dos Estados Unidos e de outros países
Os Institutos Nacionais de Saúde (National Institutes of Health – NIH), principal agência estadunidense de apoio à ciência biomédica, mantiveram-se firmes em uma nova determinação que exige que seus parceiros estrangeiros compartilhem periodicamente seus dados de pesquisas — aquela massa de informações primárias que serve de base para as conclusões de estudos — com o beneficiário principal das subvenções nos Estados Unidos.
Cientistas e organizações haviam instado a agência para que ela abandonasse ou restringisse essa regra, alertando que ela poderia dificultar ou até inviabilizar colaborações estrangeiras.
Ainda que a política final anunciada em meados de setembro apresente alguns ajustes importantes — como a exigência de que esses dados sejam compartilhados uma vez por ano, e não a cada três meses, como havia sido originalmente proposto —, ela permanece praticamente inalterada em relação ao plano lançado em maio, o qual provocou indignação generalizada da comunidade científica e estava programado para entrar em vigor agora em outubro.
“Agradecemos as mudanças, mas não tenho certeza de que elas resolvem o problema”, afirmou à revista Science o epidemiologista Albert Ko, especialista em doenças infecciosas da Universidade de Yale, nos Estados Unidos, e coautor de um comentário crítico à política publicado em 7 de setembro na revista The New England Journal of Medicine.
A atualização da política de subvenção do NIH lançada em maio afirmava que os sub-recipientes estrangeiros de subvenções concedidas pela agência em acordos de cooperação internacional em breve passariam a ser obrigados a “fornecer cópias de todas as informações primárias de suas pesquisas ao beneficiário principal da subvenção”, pelo menos a cada 3 meses. Em geral, os pesquisadores estrangeiros fornecem a seus parceiros principais nos Estados Unidos apenas os dados necessários para publicações antecipadas de estudos, mantendo consigo os dados brutos, a menos que haja uma auditoria do NIH.
Segundo o NIH, a mudança de política refletiu recomendações de relatórios de órgãos de controle do governo do país, que manifestaram preocupação em relação a um subcontrato concedido pela agência ao Instituto de Virologia de Wuhan (Wuhan Institute of Virology – WIV), na China. Alguns observadores alegaram, sem qualquer evidência direta, que o novo coronavírus (Sars-CoV-2) vazou do laboratório de Wuhan. No início deste ano, o NIH proibiu o WIV de receber novos subsídios, após o instituto chinês ter se negado a compartilhar seus dados de pesquisa.
Muitos cientistas estadunidenses consideram um exagero impor esse tipo de exigência a todos os beneficiários de subsídios estrangeiros. Alguns, que trabalham nas áreas de doenças infecciosas e saúde pública em locais como África e América Latina, argumentaram que o mandato para compartilhar dados brutos de pesquisas— desde notas de campo manuscritas a gravações e dados de pacientes que precisariam ser desidentificados— seria caro, complicado e desnecessário, o que desgastaria colaborações internacionais de longa data.
A política “envia a mensagem de que o NIH não confia em cientistas de outros países para cumprir com os mais elevados padrões de prática de investigação científica ética e responsável”, alertaram Ko e outros coautores em seus comentários na The New England Journal of Medicine. Como outros pesquisadores, eles instaram o NIH a limitar a política a certas áreas de investigação, tais como experiências arriscadas com agentes patogênicos.